O primeiro dia do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ocorreu no último domingo (21). Nele, os participantes tiveram que resolver 90 questões objetivas: 45 fizeram parte da prova de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias e outras 45 questões das disciplinas de Ciências Humanas e suas Tecnologias, além da temida redação dissertativa-argumentativa.
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O Enem é o principal meio que determina a entrada de estudantes no Ensino Superior no país, o que já provoca nervosismo entre os participantes. Agravando este quadro, o ano atípico em que a pandemia afetou completamente a estrutura escolar, muitos estavam ainda mais aflitos com o seu desempenho na prova.
Com a mudança da estrutura do exame nos últimos anos, a certeza de que certos conteúdos cairiam acabou. No lugar de questões conteudistas, uma nova face surgiu: as perguntas interpretativas. Isso é bom ou ruim?
Pensando nesses aspectos, conversamos com a professora de sociologia Silvia Beatriz Mendonça, da Escola de Educação Básica (EEB) Tiradentes, de Porto Belo. Ela foi uma das professoras convidadas que também participou do projeto do Educa SC Maratona Enem. Confira nosso bate-papo.
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Educa SC: a prova foi como o esperado ou tiveram algumas surpresas?
Silvia Beatriz Mendonça: a prova surpreendeu na forma como foram distribuídas as perguntas entre as disciplinas. Este ano, as questões de Sociologia vieram como uma “zebra”: dominaram a prova.
Em minha análise, considerei 19 questões como de Sociologia, algumas delas sendo compartilhadas também com História, Geografia e Filosofia, o que é comum não apenas pelo formato interdisciplinar da prova, mas pelo fato de que para as questões sociológicas, os dados históricos e geográficos são importantes para realizar uma análise. Assim como o espaço destinado à Sociologia surpreendeu, o pouco espaço destinado à Filosofia também.
Educa SC: o que você pensa em relação ao tema da redação deste ano?
Silvia Beatriz Mendonça: a questão da “Invisibilidade e registro civil: garantia de acesso à cidadania no Brasil” foi inesperada, mas não alheia à realidade social. Pelo contrário, a ausência do registro civil afeta o acesso à saúde pública, os programas sociais e manifestou-se gravemente durante a pandemia, já que para receber o auxílio emergencial as pessoas precisavam de seus registros.
Além disso é uma temática que pode ser discutida do ponto de vista da imigração e das pessoas trans. É uma discussão fundamental. Porém, não é um tema comum para os jovens. Acredito que tenha sido um dos temas mais difíceis entre os possíveis.
Educa SC: quais foram os pontos positivos e negativos da prova?
Silvia Beatriz Mendonça: os pontos positivos são, para alguns, considerados negativos. A prova foi ainda mais interpretativa do que já costuma ser. O que está de acordo com a ideia de que a Sociologia objetiva nos auxiliar na interpretação da realidade. Então, mais do que decorar conceitos, você precisa saber interpretar o mundo a sua volta.
Isso apareceu muito claramente nas questões que abordaram os saberes dos povos tradicionais. O que você precisava para acertar essas questões? Entender que existem diferentes modos de vida que explicam os fenômenos de maneira diferente da nossa.
Esse direcionamento mais interpretativo da prova é o que faz o Enem ser mais democrático do que outras provas de acesso ao Ensino Superior, isso possibilita que estudantes que têm uma formação menos conteudista, como a dos cursinhos de pré-vestibular, saiam bem também.
Educa SC: nos últimos anos, a prova adquiriu um caráter interpretativo. Você considera isso uma coisa boa?
Silvia Beatriz Mendonça: o Enem foi criado com o objetivo de ser a grande prova final da vida escolar e tem como fundamento, portanto, a Base Nacional Curricular Comum (BNCC) que trabalha os conteúdos de forma interdisciplinar e por competências, ou seja, a aplicação dos conteúdos na vida cotidiana.
Portanto, é importante compreendermos que menos questões sobre conceitos e mais questões interpretativas não significa deixar o conteúdo de lado.
Com a implementação total do Novo Ensino Médio, que nada mais é do que a BNCC em ação, em 2022 este modus operandi vai fazer mais sentido para estudantes e professores. Além disso, como citei anteriormente, esse direcionamento mais interpretativo da prova é o que faz o Enem ser mais democrático que outras provas de acesso ao Ensino Superior.
Educa SC: Alguma dica para os estudos do próximo Enem?
Silvia Beatriz Mendonça: acredito que seja consenso entre os profissionais da Educação que nossos jovens estão lendo pouco. Não há como você fazer uma prova como esta e se sair bem se você não tem o hábito da leitura. Isso vai influenciar, inclusive, na atenção que você consegue dedicar à interpretação das perguntas.
A leitura também dá escopo para você conhecer diferentes pontos de vista, conhecer culturas e modos de vida distintos dá suporte na construção de uma boa argumentação. Então, eu diria: leiam! E mantenho o conselho que dei na Maratona do Enem: prestem atenção ao que está acontecendo ao seu redor! As questões, a redação, elas sempre estão conectadas com a nossa realidade social.