“Transbordar amor em forma de bilhete”. É desta forma que é caracterizada a ação que, por conta do triste cenário de mais de um milhão e duzentos mil casos de Covid-19 em Santa Catarina, transformou palavras em acolhimento para dezenas de profissionais da saúde do Hospital Regional de Araranguá (HRA).
Quando Silvia Regina Guimarães de Medeiros, psicóloga clínica, olhou para seus colegas depois de mais de um ano trabalhando em uma realidade de sobrecarga física e psicológica por conta da pandemia, percebeu que algo deveria ser feito para abraçar esses profissionais que dedicaram suas vidas em prol de outras.
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O Projeto “Bilhete que Acolhe” surgiu assim: unindo a vontade de minimizar a dor e o sofrimento de profissionais da saúde da linha de frente contra o Covid-19, com a conscientização de crianças e adolescentes sobre o Sistema Único de Saúde (SUS).
Rotina pandêmica
O Hospital Regional de Araranguá viveu em uma rotina de dias intensos com a ocupação hospitalar acima de 100% durante vários meses. A alta demanda ocorreu em todos os setores: emergência, clínica, internação, Unidade de Tratamento Intensivo (UTI), administração e serviços de limpeza.
Somado ao peso do ofício, em que vários profissionais precisaram trabalhar além do horário para suprir a demanda extensiva de pacientes, o medo do contágio passou a ser um sentimento comum na vida dos trabalhadores do HRA. Apesar de todos os equipamentos de proteção individual disponibilizados aos profissionais, o risco de contaminação nunca foi nulo.
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“Foi muito desgastante, tanto fisicamente quanto psicologicamente. Sempre existiu o risco, então foi muito impactante o profissional vir trabalhar e ter que voltar para casa da família”, conta Rafael Bonfada, diretor geral do Hospital.
Com esse cenário, a necessidade de acolher e reconhecer o trabalho árduo de todos os profissionais da rede de saúde tocou o coração da Escola de Educação Básica (EEB) Dolvina Medeiros, no bairro Urussanguinha. A partir do convite de Silvia e do apoio da Coordenadoria de Educação de Araranguá, a unidade começou a trilhar o caminho da conscientização e empatia na vida de seus alunos.
Coletividade no impacto
Joice Jeronimo, diretora da unidade, formou uma força-tarefa junto de seus professores e passou em todas as salas do Ensino Fundamental e Ensino Médio para informar os estudantes sobre a realização de cartas e desenhos destinados aos profissionais de saúde.
Com muito empenho e esforço, além da esperança de inspirar os alunos a olhar de forma mais humana para com o mundo, a escola conscientizou acerca da importância do SUS e sobre o quanto é necessário a ciência para combater a pandemia e a desinformação.
“O Projeto Bilhete que Acolhe foi um gesto de agradecimento da nossa escola aos profissionais que estão trabalhando na linha de frente nessa pandemia. Percebemos que eles passaram por muita dor, em uma luta constante para salvar vidas. Nossas crianças os homenagearam nesta atitude de amor”, completa Joice.
Para Silvia, o projeto é uma oportunidade de troca de conhecimento única, pois faz com que estudantes tenham a possibilidade de debater o que está acontecendo neste momento. Desta forma, a partir da informação, eles desenvolvem o senso de respeito e altruísmo.
Gratidão e esperança por dias melhores
Todos os bilhetes de afeto e carinho feitos na escola chegaram ao hospital: alguns foram entregues em mãos; outros expostos em murais da UTI. De uma forma ou de outra, cada cartinha teve um impacto enorme na rotina de quem as recebeu.
“Os bilhetes enviados pelos alunos significam mais do que um gesto de carinho. Está sendo um acalento, um reconhecimento aos profissionais de saúde que passaram por momentos desafiadores e tristes durante a fase crítica da pandemia. É um verdadeiro gesto de cidadania e gratidão”, expressa Janaina Machado Luz, psicóloga do hospital que acompanhou de perto a atuação de seus colegas e recebeu o projeto Bilhete que Acolhe.
No total, foram mais de dez escolas participantes, inclusive de localidades fora de Araranguá que, mesmo com diferentes realidades, conseguiram ver o apelo no gesto de zelar pelos profissionais de saúde que trabalharam vigorosamente na pandemia.
Kristian de Souza, fisioterapeuta do HRA, foi uma dessas pessoas. “ A pandemia, ao contrário do que pensávamos inicialmente, teve uma duração muito longa. Aliado a isso, a demanda de trabalho, insegurança e as rotinas pesadas fez com que chegássemos ao nosso limite. Projetos como o “Bilhete que acolhe” chegam como acolhimento e reconhecimento nos dando energia para continuar”, diz.